domingo, 24 de setembro de 2023

BIBOTALK E SEU AMOR PELO MUNDO


Não assisto canais cristãos brasileiros, principalmente de segmentos teológicos fora do meu esqueleto doutrinário, e muito menos quando a coisa possui essa estética clean e universitária com frescor de beautiful people evangélica viciada em filosofia muito vista entre os reformados; mas a pedido de um seguidor do meu perfil no Facebook fui dar uma escutada no BTCast 520 do tal Bibotalk (um inteiro desconhecido para mim até então), programa dedicado a atacar os teóricos da conspiração. Antes, porém, quero ressaltar que todo este texto se refere ao grosso do universo das teorias da conspiração, ou seja, a regra, não exceções que o programa tratou feito regra. Com isto em mente, podemos começar.

Eu poderia, logo de cara, encerrar minha crítica dizendo que uma rápida examinada na rede social pública de cada um dos participantes da mesa (exceto aquele com cara de hair stylist - Rodrigo Bibo - que é mais cauteloso neste ponto) mostra posts sutilmente alinhados à esquerda do espectro político (com direito a defesa da Disney, entusiasmo com o atual governo e tudo mais), bem como amizades com esquerdistas. Inclusive, nessas buscas descobri que um deles trabalha (ou trabalhou recentemente) para a Folha de São Paulo. Todavia, eu nem precisava ter perdido tempo nisso se tivesse reparado nas edições anteriores do podcast, visto que entre elas há um programa criticando o fundamentalismo bíblico, e outro o nacionalismo.
Mas eu também poderia encerrar este texto dizendo que, como quase todo reformado, eles são ligados a escolas alexandrinas de hermenêutica e escatologia (as mesmas abraçadas pelo catolicismo e que presentearam o mundo com o Texto Crítico, mas claro que isso é só uma "teoria da conspiração") - segmentos adeptos do supersessionismo; coisa que não era exatamente um impeditivo para o surgimento de grandes homens de Deus há 200 ou 300 anos, mas que, na medida em que o mundo foi se transformando, virou uma teologia muito celebrada pelo lado político que se opõe a Israel na geopolítica do Oriente Médio: a esquerda. Sim, não é mera coincidência que as igrejas europeias tenham esfriado tanto - e que 99% desses teólogos socialistas sejam supersessionistas.
Agora, entrando no programa em si, o que posso dizer é que, em quase duas horas de podcast, me recordo deles usarem apenas um trecho de um único versículo como base bíblica para a pessoa não dar atenção a teorias conspiratórias: Mateus 6:31: "(...) não andeis ansiosos (...)". Isso porque, dentro do preconceito dessa gente, o indivíduo não pode ser antenado em teorias da conspiração simplesmente por ser alguém que goste de se informar através de fontes alternativas, alguém que goste de pensar por si mesmo; e sim por ser uma pessoa em constante desespero perante as notícias do cotidiano. Em outras palavras, esses idólatras de mainstream projetam naqueles que chamam de teóricos da conspiração aquilo que ELES foram - e ainda são - em relação ao alarmismo midiático sobre aquela gripe chinesa assintomática em 95% de quem pega: figuras hipocondríacas brincando de "senta, deita e rola" perante os desmandos de autoridades sanitárias encaradas feito entidades imaculadas e infalíveis. Ora, quando o sujeito abre seu jornal diariamente logo após sair da cama (ou assiste ao telejornal), ele está se informando; quando ele lê um livro universitário tentando entender um determinado recorte histórico, ele está estudando; mas quando faz exatamente estas mesmas coisas mediante fontes alternativas ele vira um "paranoico ansioso quanto ao dia de amanhã"? Segundo a lógica imbecilizante desses caras, sim. Se você busca ouvir notícias no Jornal Nacional, você é normal; se o faz na Revista Oeste, é um "paranoico ansioso quanto ao dia de amanhã."
Um outro sofisma arrotado pelos sósias evangélicos do João Dória no Bibotalk é o de que informações corretas são sempre validadas por meios oficias ou acadêmicos, ao passo que teorias da conspiração (a forma pejorativa deles chamarem os veículos independentes de informação) são sempre oriundas de boataria e aventureiros no assunto. Nos anos 90 esse tipo de mentira até colava, mas não hoje, quando é possível acessar imediatamente os principais portais independentes do Brasil e do mundo esbarrando com nada além de fatos pouco (ou nada) repercutidos pela grande imprensa, declarações de especialistas pouco (ou nada) ouvidos pela grande imprensa, e literatura pouco (ou nada) divulgada pela grande imprensa - escrita por gente de currículo realmente invejável.
Entre hoje mesmo, por exemplo, no ZeroHedge e você lerá que o presidente ucraniano e o primeiro-ministro canadense acabam de homenagear um veterano nazista da Segunda Guerra Mundial. O que isso tem de "teoria da conspiração"? Nada, exceto o fato de ser uma notícia não encontrada no mainstream. Digite no Google "livro Máquina de Matar" e você se deparará com uma biografia de Che Guevara nada simpática ao culto em torno desse ídolo comunista escrita por Nicolás Márquez, jornalista argentino cujo currículo - envolvendo conquistas acadêmicas e profissionais - pesa mais do que o de todos os jornalistas da nossa TV aberta juntos. Mesmo assim, segundo o raciocínio da turma do Bibotalk, se a obra não estiver nas bibliotecas universitárias, se não tiver o carimbo do MEC, é teoria da conspiração.
Obviamente existem teorias da conspiração realmente especulativas (e isso não é necessariamente um problema, desde que não seja imposto), mas elas não são "coisa de terraplanista ou antivacinas", como eles apontam ("Quem não pode atacar o argumento, ataca o argumentador." - Paul Valéry). Teorias da conspiração estão por todas as partes, apenas não recebem o devido holofote negativo quando se trata de um comunista dizendo que os EUA articularam a intervenção militar de 1964 no Brasil, que o EUA quer dominar o mundo, que o vírus da AIDS foi criado para exterminar a população homossexual, que a facada em Bolsonaro foi fake, que Bolsonaro implantaria uma ditadura nazista no país, que Bolsonaro matou (ou mandou matar) Marielle Franco, que comerciais de brinquedos tornam as crianças consumistas, que o homem foi criado pelos "deuses astronautas", que temos uma glândula secreta (pineal) que nos confere poderes mentais, que Jesus Cristo nunca existiu, etc... Dependendo de onde elas surgem, são bem recebidas (podem até ganhar um nome que lhes conceda certo ar de seriedade, como "ideologia de gênero"), e comentadas por alguém nada especializado no assunto (não custa lembrar que em 2011 os meios oficiais e acadêmicos transformaram uma garotinha de 8 anos - que somente agora, em 2023, terminou o Ensino Médio - na maior autoridade em fim do mundo por aquecimento global que existe).
Agora, a cereja no bolo foi quando um dos "intelectuais", ao se referir a grupos antiglobalistas de viés antissemita, insinuou que judeus de renome - como o imperialista George Soros - não podem ser criticados porque o fato de serem judeus torna qualquer crítica a eles um ato antissemita. E, como não poderia deixar de ser, a fala foi bem generalizante, isto é, desprovida de qualquer ressalva explicando que os movimentos "conspiracionistas" mais populares atualmente são dispensacionalistas, ramo escatológico notoriamente sionista (não, não foi por desconhecerem o dispensacionalismo, pois esse foi o tema do programa em sua reta final). Este que vos escreve, por exemplo, segue uma das tradições filossemitas mais sionistas existentes (pesquise por nomes como Eric Jon Phelps, Charles Lawson ou Sam Gipp e verá o quão distante tais pregadores passam do antissemitismo).
Desnecessário enfatizar que toda a discussão do BTCast é conduzida sob um verniz academicista (com o qual me identifico tanto quanto gritaria reteté de fundo de quintal); isto é, aquele vocabulário tecnicista típico dessa teologia elitizada tão acessível - e tocante - ao homem comum quanto as Escrituras do auge católico na Idade das Trevas. Contudo, nem esse teologuês irritante de monografia foi o bastante para impedir que um dos Dorias "crentes" retirasse sua máscara de "gente civilizada da Vila Madalena" radicalizando ao ponto de arrotar que cristão que crê em teoria da conspiração é falso convertido. Pois eu digo - repetindo o que falei num artigo que escrevi anos atrás especificamente sobre isso - exatamente o contrário: que a teoria da conspiração é a base de uma fé real e sadia, uma vez que a primeira coisa que a pessoa precisa entender para ser salva é que ela é parte de um mundo caído (Romanos 5:12) - que está no maligno (I João 5:19) e cujo deus é Satanás (2 Coríntios 4:4). Sem a consciência de que o mundo é naturalmente um lugar satânico - e que ele conspira contra tudo o que diz respeito a Deus Pai e Deus Filho (Salmos 2:2 / Atos 4:26), como o sujeito terá consciência de que é trevas (Efésios 5:8) e necessita urgentemente da salvação que só pode ser achada FORA deste mundo (Colossenses 3:1)? Portanto, é a salvação do cristão que ama o mundo (aquele de I João 2:15) e confia nos reis da terra (os mesmos citados em Apocalipse 16:14) que deve ser questionada, não a do crente inconformado com este mundo (Romanos 12:2 / I Pedro 1:14).

Leandro Pereira