Como eram os dons extraordinários (cura, maravilhas, profecia, discernimento de espíritos, línguas e interpretação de línguas) que se manifestavam na igreja do século I? Certamente eram como aquilo o que define a palavra "dom": "Qualidade inata, natural; aptidão ou talento". Um exemplo prático que, embora banal, gosto de usar para explicar essa mecânica é o quadrinho dos X-Men. Nele, os superpoderes dos personagens são chamados em alguns momentos de dons. E, o que vemos ali? Precisamente seres que, de um modo geral, têm total controle de seus poderes e os utilizam livremente. Dessa forma, se houvesse um mutante com o poder de curar, por exemplo, tenho certeza de que, a menos que ele fosse um vilão pior do que o Magneto, o veríamos restaurando a saúde dos demais a torto e a direito por aí, já que estamos falando de "dom". Isso não difere muito do que vemos no Novo Testamento. Isso não difere muito do que vemos no Novo Testamento, onde os dons do Espírito Santo independiam de correntes de oração, "atos proféticos", objetos ungidos, "lugares santos", ofertas ou qualquer outro fator além da vontade de seu portador (exceto, obviamente, em casos de bençãos a serem recebidas por terceiros, cuja fé tinha de estar em jogo).
Quando Pedro curou o coxo, ele disse claramente: O QUE TENHO isso te dou (Atos 3.6).
E disse Pedro: Não tenho prata nem ouro; mas o que tenho isso te dou. Em nome de Jesus Cristo, o Nazareno, levanta-te e anda.
Quando Paulo curou o coxo de Listra, ele não apenas ordenou que aquele homem se pusesse de pé, como discerniu espiritualmente que havia fé em seu coração para que a cura fosse operada. Simplesmente não havia como o apóstolo adivinhar isso, uma vez que aquele estava sendo o primeiro encontro entre ambos (Atos 14.8-10).
estava assentado em Listra certo homem leso dos pés, coxo desde o ventre de sua mãe, o qual nunca tinha andado. Este ouviu falar Paulo, que, fixando nele os olhos, e vendo que tinha fé para ser curado, Disse em voz alta: Levanta-te direito sobre teus pés. E ele saltou e andou.
Quando Pedro curou Enéias, ele já foi direto mandando que aquele paralítico fizesse sua cama sob a mesma certeza de um cantor que abre a boca pra entoar uma canção (Atos 9.33-34).
E achou ali certo homem, chamado Enéias, jazendo numa cama havia oito anos, o qual era paralítico. E disse-lhe Pedro: Enéias, Jesus Cristo te dá saúde; levanta-te e faze a tua cama. E logo se levantou.
Quando Eutico morreu, Paulo não fez rigorosamente nada para ressuscitá-lo além de simplesmente abraçá-lo (Atos 20.9-12).
E, estando um certo jovem, por nome Eutico, assentado numa janela, caiu do terceiro andar, tomado de um sono profundo que lhe sobreveio durante o extenso discurso de Paulo; e foi levantado morto. Paulo, porém, descendo, inclinou-se sobre ele e, abraçando-o, disse: Não vos perturbeis, que a sua alma nele está. E subindo, e partindo o pão, e comendo, ainda lhes falou largamente até à alvorada; e assim partiu. E levaram vivo o jovem, e ficaram não pouco consolados.
Quando uma víbora venenosa fincou suas presas no braço de Paulo, ele tão somente sacudiu o braço para que ela caísse na fogueira e seguiu seus dias como se nada tivesse acontecido (atos 28.3-6).
E, havendo Paulo ajuntado uma quantidade de vides, e pondo-as no fogo, uma víbora, fugindo do calor, lhe acometeu a mão. E os bárbaros, vendo-lhe a víbora pendurada na mão, diziam uns aos outros: Certamente este homem é homicida, visto como, escapando do mar, a justiça não o deixa viver. Mas, sacudindo ele a víbora no fogo, não sofreu nenhum mal. E eles esperavam que viesse a inchar ou a cair morto de repente; mas tendo esperado já muito, e vendo que nenhum incômodo lhe sobrevinha, mudando de parecer, diziam que era um deus.
Quando encontravam pessoas que já haviam passado pelo batismo de arrependimento de pecados ou que criam em Jesus mesmo sem serem batizadas e que, sendo assim, já estavam com o coração aberto para o Evangelho; os apóstolos podiam impor suas mãos sobre elas e lhes propiciar uma conversão instantânea (Atos 8.14-19/ 10.1-2;44-48/ 19.2-6).
Os apóstolos, pois, que estavam em Jerusalém, ouvindo que Samaria recebera a palavra de Deus, enviaram para lá Pedro e João. Os quais, tendo descido, oraram por eles para que recebessem o Espírito Santo (Porque sobre nenhum deles tinha ainda descido; mas somente eram batizados em nome do Senhor Jesus). Então lhes impuseram as mãos, e receberam o Espírito Santo. E Simão, vendo que pela imposição das mãos dos apóstolos era dado o Espírito Santo, lhes ofereceu dinheiro, Dizendo: Dai-me também a mim esse poder, para que aquele sobre quem eu puser as mãos receba o Espírito Santo.
E havia em Cesaréia um homem por nome Cornélio, centurião da coorte chamada italiana, Piedoso e temente a Deus, com toda a sua casa, o qual fazia muitas esmolas ao povo, e de contínuo orava a Deus./ E, dizendo Pedro ainda estas palavras, caiu o Espírito Santo sobre todos os que ouviam a palavra. E os fiéis que eram da circuncisão, todos quantos tinham vindo com Pedro, maravilharam-se de que o dom do Espírito Santo se derramasse também sobre os gentios. Porque os ouviam falar línguas, e magnificar a Deus. Respondeu, então, Pedro: Pode alguém porventura recusar a água, para que não sejam batizados estes, que também receberam como nós o Espírito Santo? E mandou que fossem batizados em nome do Senhor. Então rogaram-lhe que ficasse com eles por alguns dias.
Disse-lhes: Recebestes vós já o Espírito Santo quando crestes? E eles disseram-lhe: Nós nem ainda ouvimos que haja Espírito Santo. Perguntou-lhes, então: Em que sois batizados então? E eles disseram: No batismo de João. Mas Paulo disse: Certamente João batizou com o batismo de arrependimento, dizendo ao povo que cresse no que após ele havia de vir, isto é, em Jesus Cristo. E os que ouviram foram batizados em nome do Senhor Jesus. E, impondo-lhes Paulo as mãos, veio sobre eles o Espírito Santo; e falavam línguas, e profetizavam.
Após pregar ao eunuco em Gaza (sob uma coordenação sobrenatural absolutamente explícita, precisa e funcional), Filipe sofreu um arrebatamento horizontal indo parar em outra cidade (Azoto), pois, ao que tudo indica, por alguma razão Deus tinha pressa para que o Evangelho fosse exposto naquela região (Atos 8.39-40).
E, quando saíram da água, o Espírito do Senhor arrebatou a Filipe, e não o viu mais o eunuco; e, jubiloso, continuou o seu caminho. E Filipe se achou em Azoto e, indo passando, anunciava o evangelho em todas as cidades, até que chegou a Cesaréia.
Da mesma maneira que fixou os olhos no coxo de Listra para o curar, Paulo fixou em Elimas para o cegar temporariamente (Atos 13.9-11).
Todavia Saulo, que também se chama Paulo, cheio do Espírito Santo, e fixando os olhos nele, Disse: Ó filho do diabo, cheio de todo o engano e de toda a malícia, inimigo de toda a justiça, não cessarás de perturbar os retos caminhos do Senhor? Eis aí, pois, agora contra ti a mão do Senhor, e ficarás cego, sem ver o sol por algum tempo. E no mesmo instante a escuridão e as trevas caíram sobre ele e, andando à roda, buscava a quem o guiasse pela mão.
Qualquer coisa que tivesse contato com Paulo ficava automaticamente irradiada pelo poder do apóstolo (Atos 19.11-12). A dinâmica aqui é a mesma de Jesus, bastando que nos lembremos de que a hemorroísa se curou imediatamente ao tocar (COM FÉ) na orla das vestes de Cristo que, por sua vez, sentiu um pouco de sua virtude se esvair mesmo que o alvo do toque tenha sido sua roupa, não seu corpo (Mateus 9.20-22/ Marcos 5.25-32/ Lucas 8.43-46). Isso fica ainda mais interessante quando percebemos que Timóteo poderia ter sido curado de seu problema estomacal pelo simples contato com as cartas enviadas por Paulo, porém tudo o que vemos é que, em I Timóteo 5.23 (texto escrito entre 45 e 64 d.C) pelo menos o dom de cura já não estava mais com o apóstolo, do contrário ele não receitaria vinho para seu amigo se tratar. Além disso, em 2 Timóteo 1.6-9 Paulo manda que Timóteo desperte o dom da fé para a pregação da Palavra, não o dom de cura.
E Deus pelas mãos de Paulo fazia maravilhas extraordinárias. De sorte que até os lenços e aventais se levavam do seu corpo aos enfermos, e as enfermidades fugiam deles, e os espíritos malignos saíam.
I Coríntios 12.9 afirma que não havia apenas UM dom de curar, e sim DONS de curar. Por isso vemos que, aquilo que com Paulo se dava através de seu toque, com Pedro se dava com sua sombra (Atos 5.15-16). Obs: não bastava o dom em sim, o enfermo tinha de manifestar fé.
De sorte que transportavam os enfermos para as ruas, e os punham em leitos e em camilhas para que ao menos a sombra de Pedro, quando este passasse, cobrisse alguns deles. E até das cidades circunvizinhas concorria muita gente a Jerusalém, conduzindo enfermos e atormentados de espíritos imundos; os quais eram todos curados.
Os exemplos acima são apenas um pouco do que eu poderia apresentar aqui para demonstrar que, definitivamente, a Bíblia não chama tais poderes de "dons" à toa. Longe dos dons vistos atualmente (todos relativizados, nebulosos, de procedência espiritual duvidosa, cheios de pretextos para seus fracassos e manifestados muitas vezes por pseudo-cristãos), os dons extraordinários da igreja neotestamentária nem mesmo eram vistos em qualquer crente genuíno (isto é, bíblico, de bom testemunho público e atuante na propagação do Evangelho), mas sim somente entre os apóstolos (ou discípulos que os auxiliassem diretamente na obra). Na igreja primitiva se via reconstituição de ossos, criação de novos membros, ressurreições aos olhos de todos e sem qualquer chance de serem confundidas com catalepsia ou síndrome da morte súbita (Eutico provavelmente se quebrou bastante naquela queda), gente até então atrofiada da cintura para baixo sair saltando como uma criança, punições sobrenaturais instantâneas, arrebatamentos físicos (o famoso "teleporte" da ficção científica), crentes perscrutando o coração alheio e identificando se um determinado enfermo tinha ou não fé em Deus antes mesmo operar sua recuperação (se o exame espiritual desse negativo, provavelmente pregava-se o Evangelho ao invés de buscar-se uma cura sobrenatural a todo custo)...
Enfim, a igreja primitiva vivia de absolutos, não de subjetivismos. Se atualmente viéssemos a vivenciar ao menos um terço do que foi vivenciado por aquela geração, nem toda a manipulação midiática satânica existente seria capaz de abafar o escândalo provocado por tamanhas manifestações espirituais neste mundo globalizado. Ora, quem conseguirá reproduzir publicamente algo de impacto semelhante aos sinais e prodígios dos primeiros crentes será justamente aquele que, não por acaso, virá a ser adorado pelo planeta inteiro: o Anticristo ( II Tessalonicenses 2.9-10/ Apocaipse 16.13-14).
A esse cuja vinda é segundo a eficácia de Satanás, com todo o poder, e sinais e prodígios de mentira, E com todo o engano da injustiça para os que perecem, porque não receberam o amor da verdade para se salvarem.
E da boca do dragão, e da boca da besta, e da boca do falso profeta vi sair três espíritos imundos, semelhantes a rãs. Porque são espíritos de demônios, que fazem prodígios; os quais vão ao encontro dos reis da terra e de todo o mundo, para os congregar para a batalha, naquele grande dia do Deus Todo-Poderoso.
Enquanto os cristãos não compreenderem que a igreja de Atos tinha um diferencial em relação a nós, continuaremos ouvindo gente se perguntando como aquele grupo reduzido conseguiu, sob uma tecnologia pré-medieval e condições das mais adversas, promover e espalhar mundo afora uma crença que já atravessa dois milênios.
Enquanto os cristãos não compreenderem que a igreja de Atos tinha um diferencial em relação a nós, continuaremos vendo evangélicos se escorando em ocultismo disfarçado de dom, ao invés de produzirem para o Reino de Deus de forma concreta, afinal de contas; é mais fácil impor as mãos sobre os outros, do que pregar contra o pecado.
Enquanto os cristãos não compreenderem que a igreja de Atos tinha um diferencial em relação a nós, continuaremos sentindo a opressão maligna que se apodera mais e mais de um povo que, de maneira trêmula e claudicante, exibe mal e porcamente uma imitação barata dos poderes da igreja de Atos e, ainda assim, pensa "estar arrasando".
Condutores cegos! que coais um mosquito e engulis um camelo.- Mateus 23.24
Leandro Pereira
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