quinta-feira, 15 de março de 2018

OK, VAMOS FALAR SOBRE "O SHOW DE TRUMAN"...



Finalmente assisti ao filme O Show de Truman: O Show da Vida, longa-metragem escrito por Andrew Niccol e dirigido por Peter Weir. Realmente, não dá para achar que a mensagem implícita nele se resuma tão somente à uma denúncia subliminar sobre a crescente vigilância sofrida pela sociedade pós-moderna - coisa que, diga-se de passagem; o episódio Special Service do seriado Além da Imaginação (versão 1985), roteiro que serviu de base para o longa estrelado por Jim Carrey, já havia realizado com alguma competência, já que focou sua trama unicamente na questão da privacidade.
Acreditando ou não em Terra plana, uma coisa todos têm de concordar: muito provavelmente esse filme toca sim, na teoria. Está tudo lá: a pequena maquete do microuniverso de Truman (Seahaven) localizada numa redoma no estúdio do diretor, o fato desse mesmo estúdio residir ACIMA do teto do mundo de Truman, o nome do tal diretor (Christof, uma referência clara a "Cristo"), a ênfase que o diretor dá quando afirma ser O CRIADOR (referindo-se indiretamente à idealização do programa), e até mesmo a típica crítica generalizante ao cristianismo que boa parte dos terraplanistas tanto faz (por conta de sua guerra declarada aos jesuítas, que seriam os arquitetos da farsa heliocêntrica), pois a falsa civilização na qual o protagonista vive parou nos anos 50, ou seja, é uma característica sociedade conservadora. O conceito transmitido, portanto, é que os valores bíblicos são uma prisão, bem como que, por mais felizes que possam ser, os cristãos vivem uma mentira. Não à toa, o cotidiano do protagonista contém elementos que se repetem mecânica e diariamente para comporem a abertura do programa (uma indireta aos padrões que norteiam a vida regrada). Percebam que, ao mostrar o público que acompanha o reality show (boêmios num bar, policiais omissos, um casal de lésbicas idosas, um esquizofrênico que vive dentro de uma banheira...), o longa tenta nos convencer de que, no mundo real, o normal é ser o oposto daqueles padrões retratados em Seahaven (o que fica ainda mais nítido no diálogo entre Christof e Sylvia, quando ele afirma que "deu a Truman a oportunidade de habitar um mundo normal, e que o mundo dela é doentio"). A título de informação, o diretor Peter Weir tem no currículo 2 filmes abertamente críticos ao tradicionalismo: A Testemunha e Sociedade dos Poetas Mortos. O roteirista e co-produtor Andrew Niccol, por sua vez, chegou a dirigir, roteirizar e produzir 2 obras de cunho niilista e anticapitalista: Gattaca e O Preço do Amanhã.
É nessas horas, inclusive, que sinto falta dos grandes clássicos produzidos precisamente na época em que Truman pensava estar vivendo, como "Um Passo Além" (o precursor das séries de antologia sobre enigmas sobrenaturais, de 1959), "Além da Imaginação" (versão 1959), "A Quinta Dimensão" (versão 1963) e "Galeria do Terror" (1969); onde eram apresentadas tramas inteligentes, ocasionalmente complexas, cheias de camadas, que botavam a mente do espectador para trabalhar e, o melhor de tudo, fora da caixa - algo raríssimo na esmagadora maioria do conteúdo televisivo pobre, banal e emburrecedor feito hoje em dia -, razão pela qual não surpreende que estejamos mais próximos da sociedade que acompanhava o programa de Truman, do que daquela em que ele habitava. Detalhe: tais produções passavam longe do viés ideológico, trazendo narrativas muitas vezes até mesmo corretas do ponto de vista bíblico.
Eric Dubay, o maior nome do movimento Terra plana atualmente. Na camisa dele, vemos a promoção de 2 ideologias anticristãs: veganismo e anarquismo.

Entretanto, ao empreender um ataque à moral judaico-cristã, ironicamente a equipe criativa desse longa realiza uma pregação das mais soteriológicas. Sem querer, eles deram foi um baita tiro no pé! A Bíblia diz que a vontade de Deus é boa, agradável e perfeita (Romanos 12.2), sendo inquestionável que Seahaven é um lugar dotado de tais características. Por sinal, o próprio nome da cidade (Seahaven = Refúgio Marítimo) evoca tanto as chamadas "cidades de refúgio" da antiga Israel, quanto as várias ocasiões em que a Palavra de Deus chama o próprio Criador de refúgio. Em Seahaven, o protagonista é protegido o tempo inteiro de toda forma de mal, e se vê tentado a fugir de lá mediante o despertamento trazido por uma mulher, elemento narrativo que remete à queda do homem no Éden, onde Eva persuade Adão a comer do fruto proibido. Quando os moradores daquele "universo cristão" saem à procura de Truman, quase todos estão munidos de lanternas, e os que estão de mãos vazias encontram-se abraçados a alguém que não esteja (em Mateus 5.14, a Palavra denomina os cristãos como "luz do mundo"). As Escrituras ensinam que, semelhante ao pai que repreende sua prole, o Criador castiga aqueles que ama visando o bem de seus filhos (Provérbios 3.11-12 / Hebreus 12.5-11). E o que vemos nos últimos minutos de projeção? Precisamente Christof enviando uma tempestade sobre Truman para demovê-lo da ideia de se retirar daquele microuniverso bom, agradável e perfeito. No entanto, assim que Truman finalmente depara-se ante a porta de saída, o criador desiste de convencê-lo e deixa a cargo dele a decisão:
Os céus e a terra tomo hoje por testemunhas contra vós, de que te tenho proposto a vida e a morte, a bênção e a maldição; escolhe pois a vida, para que vivas, tu e a tua descendência, Amando ao Senhor teu Deus, dando ouvidos à sua voz, e achegando-te a ele; pois ele é a tua vida, e o prolongamento dos teus dias; para que fiques na terra que o Senhor jurou a teus pais, a Abraão, a Isaque, e a Jacó, que lhes havia de dar. - Deuteronômio 30:19,20

É importante salientar também que, na relação entre Truman e Christof, o protagonista ouve a voz do criador, mas nunca o vê. Christof, por outro lado, possui uma visão geral do protagonista e de seu pequeno universo. Enfim, a exposição da dinâmica entre Deus e a humanidade é explícita nessa obra. Entretanto, o fator mais significativo repousa na fuga de Truman de Seahaven, já que ele sai de lá atravessando uma passagem... PRETA. Ora, se a ideia era retratar a lúdica passagem de um cenário opressor para uma genuína liberdade, por que a escolha do protagonista não foi simbolizada por um caminho branco, azul ou colorido; mas preto? Certamente o conceito que a equipe criativa do filme quis trabalhar nesse ponto da trama foi o de que a verdadeira liberdade, ao contrário do que diz a Bíblia, reside nas trevas. Depois que ele passa pela porta, quem esperava que iria presenciar o reencontro do mocinho com sua amada acaba se decepcionando, visto que nem sequer um vislumbre da interação de Truman com o mundo real é mostrado. O filme simplesmente acaba. E, quando constatamos o que a Escritura fala daqueles que não estão no caminho de Cristo, daqueles que não se refugiam em Deus, a resposta espelha o término do longa: não há vida fora de Deus.
Quem tem o Filho tem a vida; quem não tem o Filho de Deus não tem a vida. - 1 João 5:12
Por isso vos disse que morrereis em vossos pecados, porque se não crerdes que eu sou, morrereis em vossos pecados. - João 8:24
Entenebrecidos no entendimento, separados da vida de Deus pela ignorância que há neles, pela dureza do seu coração; - Efésios 4:18

Ao longo de toda a projeção, presenciamos os telespectadores de Truman - fãs de carteirinha do programa que chegam ao cúmulo de decorarem suas paredes com fotos do protagonista - dando seus pitacos quanto ao que ele deve ou não fazer perante os conflitos que surgem no seu dia a dia. Então, encerrado o programa, a última sequência do filme os mostra meramente trocando de canal como se nada tivesse acontecido. Evidente que, a princípio, existe aqui uma crítica à efemeridade dos reality shows e à maneira como suas subcelebridades são descartáveis. Todavia, não deixa de expressar o meio secular, cujas relações são frias, banais e fúteis.
Leandro Pereira

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