sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

AS RAÍZES HISTÓRICAS DO DISPENSACIONALISMO



Fico impressionado como que os pós-tribulacionistas precisam apelar tanto para validarem suas teses. Se não podem pela Bíblia, precisam a todo custo queimar a história do dispensacionalismo com mentiras e distorções. Algumas coisas interessantes a serem observadas sobre certos mitos modernos que andam sendo ventilados pela internet são:

1- DARBY E SCOFIELD ERAM MAÇONS- já repararam que, embora todo neo pós-tribulacionista repita esse mantra, nenhum deles jamais nos trouxe alguma fonte do que afirma? Cadê as provas de que Darby e Scofield eram maçons?

2- SCOFIELD DIVORCIOU, RECASOU E ERA ALCOÓLATRA- "Se não pode atacar o argumento, ataque o argumentador"- Paul Valéry. Ora, ainda que essa tentativa infantil de manchar a reputação de Scofield representasse alguma retórica no campo das ideias, eu lembro aqui que tanto o alcoolismo de Scofield, bem como seu divórcio e recasamento ocorreram notoriamente muito antes de sua conversão ao Evangelho.

3- SCOFIELD IMITOU CHARLES TAZE RUSSEL, O LÍDER DAS TESTEMUNHAS DE JEOVÁ- Scofield não imitou ninguém, muito menos Charles Russel, e sim foi evangelizado pelo pastor presbiteriano James Hall Brookes, ninguém menos que o pioneiro do dispensacionalismo no EUA (James H. Brookes, Maranatha: or The Lord Cometh [Maranata: ou Vem Senhor], 10th edition [New York: Fleming H. Revell Company, 1889], p. 540). Chega a ser, inclusive, cômico escutar isso quando a seita fundada por Russel (Testemunhas de Jeová) sempre foi reconhecida por seu pós-tribulacionismo marcador de datas.

4- O DISPENSACIONALISMO CRIADO POR DARBY SURGIU INSPIRADO NAS VISÕES DA JOVEM MARGARET MACDONALD- Ora, pelo menos três anos antes de Margaret Macdonald ter suas visões, Darby já havia redigido artigos dispensacionalistas (conforme vemos registrado no livro "Entendendo o Dispensacionalismo", de Thomas Ice). Além disso, as revelações de Margaret Macdonald, embora falassem sobre um arrebatamento, na realidade eram pós-tribulacionistas.

5- AS VISÕES DE MARGARET MACDONALD ERAM PRÉ-TRIBULACIONISTAS- Se alguém se inspirou em Margaret Macdonald, foi o pós-tribulacionismo. Segue o relato da visão da jovem: "A primeira coisa que senti sob uma grande pressão foi o horrível estado da terra. Vi a imensa cegueira e paixão dos povos. Senti o choro da liberdade transformar-se no silvo da serpente para afogá-los na perdição. Uma frase se repetia: 'nenhum Deus'. E eu repetia as palavras: 'Agora há angústia das nações e, com perplexidade, os mares e as ondas rugem, os corações dos homens param de bater por medo. Só agora buscam o sinal do Filho do Homem.' Aqui fui levada a parar e gritar Não se sabe o que o sinal do Filho do Homem é: o povo de Deus pensa que estão esperando, mas eles não sabem o que é. Senti que isso precisava ser revelado, e que havia grande escuridão e erro, mas de repente, algo explodiu na minha frente com uma luz gloriosa. Vi que era apenas o próprio Senhor que descia do céu com um grito, apenas o homem glorificado, mesmo Jesus, mas que tudo à volta dele era preenchido com O Espírito Santo, para que eles possam levantar os olhos e ver o brilho da glória do Pai."- Fonte: Margaret MacDonald (visionary)- Wikipedia. AÍ EU PERGUNTO: QUE PRÉ-TRIBULACIONISMO É ESSE QUE PREGA O ARREBATAMENTO APÓS A TERRA SER DEVASTADA E, PRINCIPALMENTE, APÓS O SINAL DO FILHO DO HOMEM SURGIR NO CÉU???

6- NUNCA EXISTIU DISPENSACIONALISMO ANTES DE DARBY- Darby não criou o dispensacionalismo, e sim apenas o sistematizou e organizou; uma vez que seu professor de teologia Richard Graves em Dublin foi quem lhe apresentou o conceito ("Entendendo o Dispensacionalismo", Thomas Ice). Exemplos de dispensacionalistas que escreveram sobre dispensacionalismo antes de Darby: Justino Mártir, Irineu, Tertuliano, Metódio, Vitorino de Pettau (todos cinco considerados pais da igreja entre os séculos I e III), Hugh Latimer (século XV), Pierre Poiret, Issac Watts (ambos do século XVII), Jonathan Edwards (século XVIII) e Richard Graves (século XIX). Todos esses são casos de pregadores que entendiam a Revelação divina como algo progressivo através da história humana (bem como dividido por diferentes eras), entendiam uma separação entre Israel e a igreja no plano divino (isso bem antes do movimento sionista) e entendiam a Bíblia como um livro a ser interpretado de modo literalista. Cada um, evidentemente, com esquemas e nomenclaturas diferentes das que vemos no dispensacionalismo organizado por Darby, porém sob as mesmas premissas.

7- NUNCA EXISTIU PRÉ-TRIBULACIONISMO ANTES DE DARBY- Vejamos alguns exemplos:

***Emmanuel Lacunza- um sacerdote jesuíta católico, que ensina a possibilidade tanto de um arrebatamento midi, quanto de um arrebatamento pré-tribulacional em seu livro "The Coming of Messiah in Glory and Majesty" ["A Vinda do Messias em Glória e Majestade"], de 1812.

*** Morgan Edwards (1722-1795)- foi um dos mais influentes pregadores Batistas do seu tempo, publicou um livro na Filadélfia, em 1788, onde claramente ensina um arrebatamento pré (o nome não foi possível saber, pois só foram encontradas páginas internas fotocopiadas). O mais curioso é que, quem descobriu esse material em 1995 foi John L. Bray, um Evangelista Batista do Sul que, durante anos, publicou pequenos folhetos nos quais ridicularizava o arrebatamento pretribulacional dos santos. Seguem algumas palavras do livro: "A distância entre a primeira e a segunda ressurreição será de aproximadamente mais de mil anos. Digo aproximadamente mais porque os santos mortos ressuscitarão e os vivos serão transformados quando Cristo aparecer nos ares; e isso acontecerá cerca de três anos e meio antes do milênio, como veremos a seguir: mas ficarão ele e eles nos ares todo esse tempo? Não: eles subirão ao paraíso, ou para alguma das muitas mansões na casa do Pai, e desaparecerão durante o periodo de tempo mencionado. O objetivo dessa retirada e desaparecimento será para julgar os santos ressuscitados e transformados; pois eis que o tempo do juízo deve começar e isso pela casa de Deus..."

*** Hugh Latimer (queimado na estaca, em 1555, por causa de sua fé) disse: “Talvez aconteça em meus dias, velho como estou, ou nos dias de meus filhos... os santos serão levados ao encontro com Cristo nos ares e depois voltarão com Ele novamente” (livro Glorioso Retorno, p.50- Tim La Haye e Thomas Ice).

*** A História do Irmão Dolcino, um estudo composto em 1316 por uma fonte anônima, revela outra importante passagem tribulacional. Como líder dos Irmãos Apostólicos no norte da Itália, o Irmão Dolcino conduziu o seu povo através de tempos de tremenda perseguição papal. Uma pessoa deste grupo escreveu as seguintes palavras: "O Anticristo estava entrando neste mundo dentro dos limites do dito período de três anos e meio; e depois de sua vinda, então ele [Dolcino] e seus seguidores seriam transferidos para o Paraíso, no qual estão Enoque e Elias. E desse modo seriam preservados ilesos da perseguição do Anticristo." O escritor desta História acreditava que Dolcino e seus seguidores seriam transferidos para o paraíso, expressando esta crença com a palavra latina "transferrentur", ou “transladação”, um sinônimo de "arrebatamento".(Enciclopédia Popular de Profecia Bíblica, 2008, p.91-92- Thomas Ice e James Stitzinger). Vemos, portanto, que Dolcino pregava um arrebatamento, no mínimo, midi-tribulacionista, ou seja, uma volta de Jesus em duas etapas.

*** Pseudo-Efraim (séc.III-VI). Dentre bastante coisa escrita por ele a respeito de um arrebatamento pré, vemos: "Nós devemos compreender perfeitamente por isso, meus irmãos, o que é iminente ou pendente. Houve fomes e pestes, abalos violentos das nações e sinais, os quais foram previstos pelo Senhor, e foram cumpridos (consumados), e nada mais resta, exceto a vinda do iníquo [o homem do pecado] na plenitude do reino romano. Por que estamos ocupados com os negócios do mundo, e nossa mentalidade nos desejos pecaminosos deste mundo ou nas preocupações deste tempo? Portanto, porque não rejeitamos cada preocupação com as coisas terrenas e nos preparamos para o encontro com nosso Senhor Jesus Cristo, para que nos leve da confusão que oprime o mundo? Acredite-me, queridos irmãos, porque a vinda (chegada) do Senhor está próxima, acredite em mim, porque o fim do mundo está próximo, acreditem, porque é o verdadeiro final dos tempos. Ou não irão crer a menos que vejam com seus próprios olhos? Vejam que esta frase não se compre em vocês como declara o profeta: 'Ai dos que desejam ver o dia do Senhor!' Porque os santos e escolhidos serão reunidos antes da tribulação que há de vir, e serão levados ao o Senhor para não verem a confusão que dominará o mundo por causa dos pecados. E assim, meus queridos irmãos, é a décima primeira hora, e o fim do mundo vem com a ceifa, e os anjos armados e preparados, com foices nas mãos, esperando o império do Senhor."

*** Victorinus escreveu um comentário por volta do ano 240 sobre o livro de Apocalipse. Em seu comentário, Victorinus refere-se à frase de Paulo: “aquele que o detém, até que saia do meio dela“, onde ele mostra claramente acreditar que era a igreja arrebatada que “saiu do meio” da terra. “E vi outro sinal grande e maravilhoso, sete anjos com as sete últimas pragas; Pois neles se completa a Ira de Deus. (Apocalipse 15:1) e estes estarão na última hora, quando a Igreja sairá do meio dela (2 Tessalonicenses 2:7).” (Comentário sobre Apocalipse 15.1). Em outro lugar, Victorinus mostra que ele acredita em um arrebatamento da Igreja: “O céu sendo aberto como um rolo é a Igreja sendo levada embora (Apocalipse 6:14).” (Comentário sobre Apocalipse 6:14)

*** Pastor de Hermas foi escrito por volta do ano 150. Ele descreve um sonho e dá a interpretação dele. A Igreja (a noiva vestida de branco) escapa da Grande Tribulação por causa da promessa do Senhor, essa interpretação está mais ligada ao ensino de arrebatamento midi da Tribulação, visto que a Grande Tribulação ocorre nos últimos três anos e meio como disse Jesus, mas não deixa de ser uma interpretação pré em contraponto a interpretação pós-tribulacionista. Certamente o Pastor de Hermas não pode ser considerado como Escritura Sagrada, mas mostra que muitos cristãos do segundo século acreditavam em um arrebatamento que não era pós-tribulacionista. Eis um pouco de seu ensino: “Ide, pois, e declarai ao Eleito do Senhor, de poderosos feitos, e dize-lhes que esta besta é um tipo da Grande Tribulação que está para vir. Se, pois, vos preparardes, e com todo o vosso coração, converter-vos ao Senhor em arrependimento. Então podereis escapar dele. Se o seu coração é puro e irrepreensível … a cor dourada representa que você escapou deste mundo. … Agora sabeis o símbolo da Grande Tribulação que está por vir. Mas se tiveres dispostos, isso não será nada.” (Pastor de Hermas)

***Cipriano foi o bispo de Cartago por volta de 250. Observe que ele não ensinou que devemos suportar o tempo do Anticristo, mas que nós seremos “livres” dele. Ele disse aos seus leitores que a ressurreição futura era a esperança do cristão e apontou que o arrebatamento “que nos tiraria” deveria nos motivar à medida que vemos os últimos dias se aproximando: “Nós, que vemos que coisas terríveis começaram. E sei que ainda mais coisas terríveis que são iminentes podem ser consideradas como uma grande vantagem para partirmos daqui o mais rapidamente possível. Você não dá graças a Deus, você não se congratula, que por uma partida precoce você será levado embora, e livre dos naufrágios e desastres que são iminentes? Saudamos o dia que nos leva a cada um de nós para a sua própria casa, que nos arrebata, e nos liberta das ações do mundo, e restaura-nos ao paraíso e ao reino” (Tratados de Cipriano – 21 a 26)/ “O Anticristo está vindo, mas acima dele vem também Cristo, o inimigo vem e se enfurece, mas imediatamente o Senhor segue para vingar nosso sofrimento e nossas feridas. O adversário está enfurecido e ameaça, mas há Um que pode nos livrar de suas mãos.” (Epístola 55 – Cipriano)

Irineu (por volta de 180) ensinou que todos os cristãos maduros seriam pré-milenistas: “Os novos céus e terra são os primeiros criados e então a nova Jerusalém desce. Essas são coisas literais, e os cristãos que as alegorizam são cristãos imaturos.” (Contra Heresias 5.35). Quando ele ensinava que a ordem dos eventos era de que haverá uma ressurreição física, então o Reino Milenar, então os novos céus e a nova terra e a Nova Jerusalém, é importante ressaltar que ele tinha convicção de que esses eventos todos eram literais. Sobre o pré-tribulacionismo, Irineu escreveu: “Quando, no fim, essa Igreja será repentinamente arrebatada disto, então é dito, ‘Haverá tribulação como não houve desde o início, nem haverá.’” (Contra Heresias 5.29)



Portanto, fica o recado: antes de saírem por aí reproduzindo discursos decorados à base de orelhadas e achismos, que tal fazerem o dever de casa e rebustecerem seus ataques com alguma base bibliográfica que lhes ofereça uma credibilidade mínima perante o que afirmam?

Leandro Pereira

Obs: agradeço ao canal Mario Persona e aos blogs Sola Scriptura TT e Dionei Cleber Vieira, cujos conteúdos auxiliaram em minha pesquisa.

Um comentário:

  1. Bom dia,
    Realmente os pregadores pós tribulacionistas apelam muito nesse assunto, além de compreenderem e interpretar vários textos sem o contexto.

    ResponderExcluir